Porque é aqui que há de nascer
e gerar frutos a minha e a sua eterna
ignorância. Aqui que há de encontrar a
vitalidade e o sustento máximo para a
sua loucura. Aqui vive, agoniza, mas não
morre o nosso egoísmo e a nossa faceta
que imprime necessidades.
Três vivas e saudações ao seu umbigo.

sábado, outubro 29, 2005


Sinestesia

Qualquer cama é grande demais.
Qualquer noite é fria o suficiente pra que eu me cubra, encubra e me esconda.
É como se os meus olhos fossem vazios de vida e opacos de esperar.
Como se o relembrar fosse a saciedade dessa secura amarga que beira a rouquidão de uma garganta arranhada de quase gritar.
É um fumo velho e um disco arranhado.
A roupa que cheira a tempo e o tempo que veste a calma.
É sangrar um sangue escuro e empedrado. É não querer sentir porque isso corroeria a minha anestesia declarada.
É o desprezo convidativo à uma nova loucura.
Loucura de crer no invisível ou no si mesmo.
De absorver o medo antes que ele me absorva.
E de cobrar reparos a um coração estraçalhado.
Loucura minha de viver sozinha e almejar o singular.
De tentar um sol quando são três da matina.
De esconder as olheiras num batom vermelho. Ou de rir da vida antes que ela me satirize.
É chorar um choro miúdo. Um choro pingado, um choro empoeirado.
É tentar a sua camisa pra eu caber no seu tamanho.
Esquecer seu travesseiro e preservar o seu espaço.
É como quem mantém a rotina pela doença do hábito.
Nenhum braço vai me esconder, como os seus faziam em toda a minha fuga.
Nenhum colo vai me esquentar, me curar ou proteger, ainda que nele eu esteja em cortesia.
Nenhum sexo vai me fazer implorar e nenhum beijo vai me testar e furtar.
Qualquer saudade é menos intensa e qualquer perda é menos sentida.
Nenhuma mão saberá pegar na minha ou eu que não quero mais entender das friezas de homem algum.