Porque é aqui que há de nascer
e gerar frutos a minha e a sua eterna
ignorância. Aqui que há de encontrar a
vitalidade e o sustento máximo para a
sua loucura. Aqui vive, agoniza, mas não
morre o nosso egoísmo e a nossa faceta
que imprime necessidades.
Três vivas e saudações ao seu umbigo.

quarta-feira, janeiro 19, 2005


Well

Sete horas imensuráveis e eternas num calor paranaense. Mais ou menos assim, e eu cheguei, aos pedaços, na minha futura terra natal.
Hotel cinco estrelas, ar condicionado, elevador panorâmico e dezoito andares de luxúria.
Mi-nha-ci-da-de.
Passei a treinar uns "tchê", uns "bah" e tomei chimarrão no café da manhã.
Chimarrão fortê, como todo e bom gaúcho.
No primeiro dia de prova, depois de subir cinco quadras e descer quatro nuns cinquenta e sete graus, avistei o IEEL, lugar onde seriam realizadas as minhas provas.
"vazio, né?"
"é. deve ser um bom sinal."
"é"
Entremos.
"com lincença. com lincença."
"shh" -disse um grupo de menininhas e menininhos- "é paulista"
"ah. hehe. eu sou"
E subi para sala.
Assim que entrei na fila para assinar a lista de presença, me deparo com um moreno alto, forte, rico e todo sorridente: o-meu-fis-cal.
"você é paulista."
"é, sou... tá na cara?"
"tá"
Hum.
"é você na foto, menina?" -disse a loirinha ajudante-do-fis-cal.
"sou, sim."
"tem certeza?"
"ahm. tenho"
"é que tá tão diferente né? três fotos completamente diferentes"
Três fotos, entenda: a foto colada, o RG e o XÉROX DO RG.
"assina aí vai"
Comecei a escrever de LETRA DE FORMA, para não haver dúvida de que eu era eu, até que ela me vem com um "tem que ser igual ao do RG". O que eu fiz? Risquei e comecei de novo, é claro.
"não! não pode rasurar! espera aí fora. tô achando que você não vai fazer prova."
Esperei, esperei, esperei.
Abri a porta e entrei.
"com lincença. com licença."
Ninguém veio me tirar de lá, pensei que tinha dado certo, até a moça vir com o carimbo-de-impressão-digital.
"ahm. as duas mãos. você vai tirar duas."
"tá. escuta, eu queria ir ao banheiro, posso?"
"pode sim. espera as mocinhas chegarem porque precisam te acompanhar"
Esperei, esperei, esperei.
Uh! As mocinhas. As moçoilas. Dois por dois, no mínimo.
Vamos lá, a calça estourando, a bexiga pedindo ar até que me mostram um senhor, simpático, delicado e manco.
"põe uma perna em cada x e as mãos na cabeça"
"assim?"
"isso"
-Pi Pi Pi Pi Pi na orelha
-Pi Pi Pi Pi Pi na barriga
"ahm. eu tenho alguns piercings"
"vai ter que tirar"
"como? não dá! dói!"
"então não pode."
"moço, eu só quero fazer xixi!"
"Não vai."
Uns dez minutos depois, uma senhora gorduchinha sussurra no ouvido do simpático.
"é. tem razão. pode ser a perna."
A perna. O cara tinha uma perna mecânica.
Decidiram portanto, que eu poderia fazer xixi.
"tira a blusa e abaixa a calça."
"como?"
"isso. calcinha e sutiã."
"não entendi."
"tira a blusa menina."
"moça, eu só queria fazer xi..."
"olha assim fica difícil você fazer a prova"
"tá bom, tá bom, tá bom"
"Vira de costas"
"Agh. Tá"
...
"pronto?"
...
"moça? posso fazer xi..."
"vai logo. Não fecha a porta."
"Não pode nem encostar?"
"Não."
Lá vamos nós, eu e a minha psicologia de pensar no barulhinho da torneira. No meu cachorro. Na minha mãe. No meu anel. Na minha vaga da UEL. Em qualquer coisa que me tirasse aquele brutamonte da frente.
Fiquei lá. Agaixada naquela posição meio em pé meio sentada jurando amores às Cataratas do Iguaçu e nada.
Nada.
Nada.
Nada.
Nada.
Fui embora.
E só quero ouvir um "tchê" se eu passar em primeiro lugar.