quinta-feira, maio 17, 2007
E pra matar as saudades
De tanto tempo. De tanta ausência. De tanta distância. De tanta carência. Again. Nós dois. O primeiro é dele. O menino Breno.
Eu sou o meu inimigo
Branco, alto, loiro, barriga próspera, bem educado, ensino superior, poliglota, quando nao era estudante e ainda tinha grana dos meus pais tambem comprava roupa cara e bebia whiskey à 15 reais o copo. Nao importa que eu gastasse a maior parte da grana em disco e livros, eu era um burgues, sem duvida, e sou. Sou meu inimigo. E nao posso me esconder por que alem disso sou homem, heterossexual e bonito. Nao faco parte de nenhuma minoria. Todas as partes do meu corpo estao no lugar e funcionam, nenhuma doenca venerea, nenhum problema congenito, nenhuma marca de espinha, sarampo, rubeola, catapora, caxumba. Nao tive paralisia infantil, nao fui subnutrido. Nao fui espancado, molestado ou violentado. Nao tive pai alcoolatra, nem mae puta. Nao comi pao com bosta, mas, verdade seja dita, comi caviar com gosto. Com 5 anos eu já sabia ler e escrever e nao minto que sempre me gabei da extravagancia que é ser inteligente. Eu sou meu inimigo. Nao posso me esconder atras de nenhuma minoria, nenhuma serve e a carapuca se nao é larga é apertada. Se vejo um pobre preto atravessando a rua na minha direcao as 10 da noite na praca da Sé, claro, mudo de lado, escondo a carteira, fico com medo... e por que nao dizer, com culpa. Eu nao sou ele, nunca fui, nunca roubei ninguem, nunca matei ninguem, nunca briguei por comida, nunca passei 24 horas sem enfiar nada no estomago, nunca passei uma semana sem tomar banho, nunca fiquei um ano sem cortar o cabelo, nunca fiquei um mes se contar as unhas. Sempre tive dinheiro pra comprar perfume. Eu sou o meu inimigo, e deveria ser o inimigo publico numero um. Nao porque eu jah tenha roubado chocolate suico no supermercado, mas porque eu sou eu, e nao posso fazer nada contra isso... e nem quero. Nao digo que se eu fosse uma negra lesbica ana e cega nascida no interior do maranhao e emigrada em pau de arara nos anos 40 as coisas seriam mais faceis, nao seriam, mas eu poderia esconder todos os meus problemas (e nao sem razao) atras das 300 minorias das quais fizesse parte. E ai talvez eu fosse alguem mais interessante para o mundo. E nao o meu inimigo. Eu nao sei dancar Samba, nao sei cantar RAP, nao sei tocar cavaquinho. Nao gosto de pagode, nem de funk e nem de grandes demonstracoes de cultura popular, mas nao escondo que acho Racionais um puta som – mas eles nao falam pra mim, alias, muito pelo contrario, eles falam contra mim. Eu sou o inimigo dos Racionais, e de todos os fas dos Racionais. Nao torco para o Corinthians, nem para o Flamengo e até diria que torco para o Sao Paulo, time de burgues, mas na verdade nao acompanho nem Copa Libertadores, quando muito final de mundial e ainda assim sem entender muita coisa, pra ser sincero, nao gosto de futebol. Nao gosto de futebol e nao sei chutar uma bola sem me machucar, machucar alguem ou ser expulso de campo por falta de habilidade. Entao eu paro e penso: o que eu posso fazer pelo meu mundo hoje? Tomando uma Coca-Cola, de frente para o meu lap-top de ultima geracao chego à brilhante conclusao que o melhor que fiz na vida foi estudar literatura. Que belo modo de mudar as coisas. De repente a verdade é que eu nao quero mudar o mundo e nao quero que as coisas mudem por que minha posicao é muito confortavel, muito gostosa. Por essa razao, eu sou meu inimigo. Aí eu posso dizer que é errado discriminar alguem por ser mulher, preto, pobre, crente, puta, anao, lesbica, viado, judeu ou qualquer minoria, e claro, sair até bonito no fim da história. Mas vou contiuar rico, branco e poliglota. Vou continuar sendo meu inimigo.
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